PORTUGAL Manifestação de Apoio ao Povo Grego – OXI, OXI, OXI!

Manifestação de solidariedade em Lisboa

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A manifestação de apoio ao povo grego juntou este sábado mais de mil pessoas. O cortejo partiu do Príncipe Real para o Largo Jean Monnet, onde se encontra a representação da UE em Portugal. “O combate que hoje se vive é pela própria Democracia e pela Europa e nós escolhemos a solidariedade com o povo grego e a Europa dos povos e não a da dívida e dos mercados”, diz o texto que convocou a manifestação. A porta-voz do Bloco, Catarina Martins, e o líder parlamentar Pedro Filipe Soares também marcaram presença nesta ação de solidariedade em Lisboa. Veja

Fotos de Paulete Matos

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A abdicação da democracia

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Os gregos estão a ser punidos por terem tido um atrevimento intolerável: acreditaram na possibilidade de combinar Europa e democracia.

 Artsenal

Artsenal

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por José Soeiro

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“A inflexibilidade negocial de Bruxelas, e os sucessivos “diktats” de Berlim, mostram que a U.E. passou a ser ‘uma ditadura sobre democracias’. (…) É difícil de acreditar que em todas as reuniões de Bruxelas o resultado tenha sempre sido de 18-1. Onde estão os moderados? Onde os membros da Internacional Socialista? Onde os poucos Democratas Cristãos que ainda restam?

As palavras são de Freitas do Amaral, numa sessão realizada ontem à noite. E assinalam uma perplexidade que é cada vez mais ampla. Se há coisa que ficou clara nos últimos dias foi que as instituições europeias nunca procuraram verdadeiramente nenhum acordo para a Grécia. O que está em causa não é encontrar uma solução que seja aceitável por ambas as partes. Do que se trata é de procurar substituir um Governo eleito que teve a ousadia de desafiar a atual doxa europeia. O valor do desacordo inultrapassável, dizem-nos, é de 600 milhões de euros. Ou seja, uma migalha no orçamento europeu (uma migalha, até, para o orçamento português). Não é pois por coisa tão pouca que não se alcança um acordo. É uma razão política mais profunda: Berlim e Bruxelas não toleram que haja um governo que tem outras soluções. Por isso entraram em campanha – usando todas as armas e em força.

Em primeiro lugar, a chantagem financeira. A decisão do Banco Central Europeu de fechar a torneira e de pôr em causa a liquidez dos bancos, obrigando ao controlo da fuga de capital e às limitações nos multibancos, é uma medida puramente política. Nunca essa decisão foi tomada relativamente à Irlanda e a Portugal. Por uma razão simples: eram governos “amigos”. O objetivo é por isso criar um clima de medo para condicionar o referendo. O que torna explícito que as instituições europeias se tornaram facilitadores dos governos de direita e mecanismos de embargo a qualquer projeto alternativo.

Em segundo lugar, a comoção seletiva. O que dizer do coro de comentadores e responsáveis políticos que se mostram condoídos com o facto de os gregos só poderem levantar 60 euros por dia nas caixas multibanco (ou seja, 1.800 euros por mês em dinheiro de bolso, porque todas as operações e pagamentos multibanco se mantêm) quando, ao mesmo tempo, defendem que é obrigatório cortar as pensões que já foram reduzidas em 62%? A comoção pública é assim um biombo da hipocrisia: onde estava ela, afinal, quando os gregos faziam fila para a sopa dos pobres ou para as clínicas solidárias improvisadas, depois de os planos de austeridade terem condenados milhares à pobreza e terem expulsado 3 milhões do acesso a cuidados de saúde?

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Vários prémios Nobel da economia, como Stiglitz e Krugman, têm explicado que a proposta das instituições é inaceitável precisamente porque vai prolongar a miséria e por isso apelam ao não no referendo

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Em terceiro lugar, a distorção. Nas televisões, sucedem-se reportagens sobre a miséria na Grécia, que sugerem que esse é o “país” criado pelo Syriza, cujo governo tem meia dúzia de meses. Curioso não apresentarem essa miséria como o resultado de anos de austeridade, ou seja, da aplicação da receita na qual as instituições insistem agora e que o Governo grego procura evitar. Vários prémios Nobel da economia, como Stiglitz e Krugman, têm explicado que a proposta das instituições é inaceitável precisamente porque vai prolongar a miséria e por isso apelam ao não no referendo. Krugman classificou mesmo o comportamento dos governos e credores como “um ato de loucura monstruosa”.

Por último, a manipulação. Continua a dizer-se que os gregos “já receberam muito dinheiro” da Europa e que não quiseram é fazer reformas. Não vale a pena perder demasiado tempo a argumentar. Um gráfico da TVI, a partir de dados do Financial Times, tem desmentido essa narrativa enganadora: dos 240 mil milhões recebidos pela Grécia, só 10% foi dinheiro disponível para o Governo grego. 90% foi para ajudas aos bancos e para pagar juros à Alemanha e à França.

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Dos 240 mil milhões recebidos pela Grécia, só 10% foi dinheiro disponível para o Governo grego. 90% foi para ajudas aos bancos e para pagar juros à Alemanha e à França

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Quando, em 1957, foi debatido o tratado de Roma que criava o mercado comum europeu, o socialista francês Mendès-France (primeiro-ministro nos anos 50), dizia na Assembleia Nacional: “a abdicação da nossa democracia pode ser conseguida de duas formas. Pelo recurso a uma nova ditadura interna pela concentração de todos os poderes num homem providencial, ou pela delegação desses poderes a uma autoridade externa, a qual, em nome da técnica, exercerá na realidade o poder político. Porque em nome de uma economia saudável facilmente irá impor uma política orçamental, social e finalmente uma ‘política’ no sentido mais abrangente do termo, nacional e internacional”.

Na verdade, é isso que se está a passar. Há um ultimato financeiro para derrotar qualquer vislumbre democrático. Os gregos estão a ser punidos por terem tido um atrevimento intolerável: acreditaram na possibilidade de combinar Europa e democracia.

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Eusébio

Portugal

Portugal

Eusébio da Silva Ferreira – maior expoente de todos os tempos da Seleção de Futebol de Portugal – morreu às 4h30 de 5 de janeiro de 2014, em Lisboa, vítima de uma parada cardiorrespiratória. Ele já apresentava sinais de saúde debilitada desde que sofreu um acidente vascular cerebral (AVC) em junho de 2012.

O Pantera Negra, como era conhecido no mundo futebol, teve carreira profissional quase toda no clube Benfica, de Lisboa, e na seleção portuguesa. Foi eleito o melhor jogador do mundo em 1965, quando ganhou a Bola de Ouro, e escolhido Bota de Ouro em 1968 e em 1973.

Na Copa do Mundo de Futebol de 1966, na Inglaterra, foi considerado o melhor jogador da competição, quando marcou nove gols, levando o time de Portugal ao terceiro lugar da Copa.

Eusébio nasceu em 25 de janeiro de 1942, na cidade de São Lourenço Marques (atual Maputo), em Moçambique, na África – ex-colônia portuguesa.

Nada será como dantes

por Rui Bebiano

athens grécia
Foram grandes as expectativas criadas em Portugal com a vitória do Syriza nas eleições do passado Janeiro. A direita no governo, apoiada por uma maioria dos órgãos de comunicação transformada em caixa-de-ressonância, rapidamente desenhou os piores cenários, considerando-a um erro de avaliação da parte dos gregos – obviamente entendidos como crianças grandes, politicamente menorizadas –, e antevendo, como consequência, o incumprimento do pagamento da dívida, tal como a saída da Grécia do euro ou mesmo da União Europeia. Ao mesmo tempo, um sobressalto transversal foi partilhado pela quase totalidade da esquerda e do centro-esquerda, traduzido numa visível simpatia pelo novo governo de Atenas e por alguns dos seus protagonistas, bem como num apoio expresso ou tácito às suas escolhas.

Foi assim que alguns militantes e dirigentes do Partido Socialista, bem como muitos dos seus simpatizantes e presumíveis votantes, exultaram publicamente com aquela vitória, embora, como era de esperar, desde o início outros a temessem ou rejeitassem de forma liminar. Foi assim que o PCP, sem apoiar expressamente o Syriza, se eximiu de o criticar, ao contrário daquilo que, como é sabido, tem feito o KKE, o Partido Comunista da Grécia, que o combate por lhe atribuir um papel de mera «muleta do capitalismo». Foi assim também que a nossa «esquerda da esquerda» apoiou incondicionalmente a experiência grega, assumindo como suas as suas escolhas, por muito que algumas delas, em particular aquelas que têm privilegiado os fatores de unidade e de moderação, sejam estranhas a muitas das suas opções políticas internas.

Aquilo que ninguém nesta área política fez foi, porém, prever a forte possibilidade da experiência grega falhar, suscitando uma onda de choque capaz de mergulhar no desânimo e de deixar sem um vislumbre de saída otimista, quem, por um exercício de vontade, numa primeira fase participou dessa exaltação quase unanimista. À hora a que escrevo ninguém poderá, é um facto, salvo se enveredar por um inútil exercício de adivinhação, traçar o desfecho desta etapa dramática da história da Grécia. Mas uma coisa é certa: todos, cá e lá, estamos a experimentar um banho de realismo, uma vez que poucas coisas aconteceram como o previsto. Um banho cujos efeitos na nossa perceção da coisa pública – e da relação da esquerda com a conquista e o exercício do poder na Europa de hoje – se encontra ainda por avaliar.

A dimensão do recuo do Syriza, tal como a das fraturas que por esse motivo este irá inevitavelmente conhecer, é ainda desconhecida. Como o é a capacidade do povo grego para conservar nas circunstâncias presentes o seu capital de esperança. Mas uma coisa é segura: uma vez mais está a ficar provado que não é possível moldar o curso da história apenas por um exercício de vontade ou com recurso a gestos de bravura. O que força sempre a procurar novas vias para reduzir os danos e evitar o pior, agregando forças de forma aberta e criativa com base no que é prioritário para a vida das pessoas e dos Estados. Governar a direito, essencialmente a régua e esquadro e na rejeição da democracia, tentaram-no Hitler ou Estaline, com os resultados que se conhecem. Só ao procurar consensos, unindo o que houver a unir, se poderá conhecer o modo de evitá-lo. Neste domínio o Syriza tem sido exemplar. Pelo menos até agora.

Aprendamos a dançar sem medo

por Tiago Mota Saraiva

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109 mil soldados para uma população de 10 milhões de habitantes. 10 militares por mil habitantes. É o país com o rácio mais alto da Europa (França tem 3,5, Espanha 2,5, Portugal 3,1). Nos últimos dez anos, 4% do PIB foi gasto na defesa, o dobro do que a NATO, sempre empenhada em pressionar aumentos orçamentais nesta área, recomenda. Dos países da NATO, somente os EUA gastam mais em percentagem do PIB. Neste mesmo tempo histórico, este país importou equipamento militar no valor de 12 mil milhões de euros. Entre 2005 e 2009 foi o quinto maior importador de armas do mundo. Nas suas fileiras conta com 1620 blindados, mais do que Alemanha, França e Itália juntas.

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Este país é a Grécia e estes números foram revelados esta semana pelo “Público” espanhol. Mas há mais um dado particularmente relevante. Grande parte da despesa grega em armamento foi realizada com a Alemanha e França, 4 mil milhões e 3 mil milhões, respectivamente. Segundo o “Guardian”, em 2012, as vendas de armamento para a Grécia representavam 15% do total de exportações alemãs nestas áreas. Yorgos Papandréu, assessor do primeiro-ministro grego entre 2009 e 2011, declarou que ninguém lhes dizia para comprar armas, mas que a UE ficava sempre mais solícita se o fizessem.

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O actual braço-de-ferro entre os donos disto tudo e a Grécia não é apenas decisivo para o povo grego. Se a Grécia claudica e aceita o acordo que a pretende vergar e castigar por ameaçar levantar a cabeça, perdemos todos. Se o povo grego rejeitar o acordo, abre-se uma frente que terá de ter correspondência, em Portugal, muito além dos ineficazes manifestos de militante solidariedade. Depois da Grécia, estamos na linha da frente deste plano de extorsão e empobrecimento. Passará por todos nós a decisão de continuar de cabeça baixa à espera dos novos cortes nas pensões/ordenados e aumentos do IVA, ou ganhar coragem e perder o medo.
Não há saídas fáceis. Todos os caminhos de fuga estão armadilhados, mas quanto mais nos deixarmos afundar neste buraco, mais dura será a saída.

(publicado ontem no jornal i)

[Apenas a Polícia Militar de São Paulo, um dos maiores exército do mundo, possui um efetivo de cem mil soldados]

 

Paralíticos Gregos vs Donas de Casa da HSBC

por Rui Curado Silva

 

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Ouvimos José Rodrigues dos Santos a fazer eco das vozes que apontam como principal problema da crise grega exemplos como o dos falsos paralíticos. O argumento cola bem quando se quer atiçar pobres contra pobres, mas a verdade é que o subsídio atribuído aos falsos paralíticos que enganavam fisco grego não se compara nem de perto nem de longe com o roubo gigantesco das “donas de casa” da HSBC. Dona de casa era uma das profissões virtuais declaradas por clientes do HSBC que na verdade eram industriais, artistas, jornalistas, princesas, traficantes de armas ou de droga. É esta diferença de campeonatos entre os paralíticos e as donas de casa que ajuda a compreender melhor a crise grega. As contas “especiais” (contas artilhadas para fugir ao fisco) do HSBC relacionadas com a Grécia ascendem a mais de 2,3 mil milhões de euros (~2,6 mil milhões de dólares). Por exemplo, um dos apanhados, o grego Lavrentis Lavrentiadis tinha sete contas no HSBC com ligações a outras contas bancárias (paraísos fiscais) onde detinha 4,6 milhões de dólares. O senhor Lavrentiadis não era paralítico, mas em 2012 foi acusado de fraude, lavagem de dinheiro, participação em associação criminosa e de emprestar a si próprio, cerca de 600 milhões de euros, através de um banco do seu próprio grupo. Esteve 18 meses em prisão preventiva e vai ser julgado em março deste ano.
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Em Portugal, as denuncias de fraude favoritas dos ultraliberais são os beneficiários do rendimento de inserção, os desempregados e pessoas de baixa. São eles que destroem o estado, são eles que desmotivam a sociedade, não querem trabalhar, fomentam preguiça, etc. Ora, em média o rendimento de inserção é da ordem dos 90€ mensais. Só o montante total das contas especiais da HSBC relacionadas com Portugal ascendem a cerca de 850 milhões de euros, ou seja cerca de três vezes o orçamento de estado para o rendimento de inserção. E convém sublinhar que a fraude das contas especiais do HSBC é apenas uma pequena parte da fraude fiscal relativa a esse anos.
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A grande preocupação dos ultraliberais são as migalhas, porque o bolo já é deles.

O Brasil festeja: Fernando Tordo está residindo no Recife

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Está no Brasil Fernando Tordo, que escolheu a cidade do Recife para residir. Que seja bem-vindo. É uma presença que enobrece Pernambuco.

In Wikipédia: Fernando Travassos Tordo é um cantor e compositor português. Compôs algumas das músicas mais emblemáticas do cancioneiro da língua portuguesa com o poeta José Carlos Ary dos Santos entre elas “Tourada”, “Estrela da Tarde”, “Lisboa Menina e Moça”, “Cavalo à Solta”, “Balada para os Nossos Filhos” e “O Amigo que eu canto”. Os seus temas são cantados por intérpretes como Carlos do Carmo, Mariza, Carminho, Amor Electro, Simone de Oliveira entre outros. Venceu também o Festival RTP da Canção em 1973 com “Tourada” e em 1977 com “Portugal no Coração”. É considerado uma figura tutelar da música Portuguesa pela extensão e originalidade da sua obra.

Tordo começou a cantar aos 16 anos, passou pelos Deltons e pelos Sheiks, em 1968, na sua parte final. onde substituiu Carlos Mendes. Participou no Festival RTP da Canção de 1969 onde interpretou o tema “Cantiga”. Nesse mesmo festival conheceu o poeta Ary dos Santos. Foi um dos vencedores do Prémio Casa da Imprensa como cançonetista e compositor (“pela riqueza harmónica, melódica e rítmica dos trabalhos gravados em disco”).

Em cerca de 38 anos de carreira, Tordo editou 28 discos, fez milhares de espectáculos, manteve-se fiel a um estilo e conseguiu sucessos que perduram.

Alguns dos seus temas mais conhecidos são “O café” (Tordo/Ary dos Santos), “Tourada” (Tordo/Ary dos Santos), “Cavalo à solta” (Tordo/Ary dos Santos), “Balada para nossos filhos” (Tordo/Ary dos Santos), “Estrela da tarde” (Tordo/Ary dos Santos), “Novo fado alegre” (Tordo/Ary dos Santos), “Adeus Tristeza” (Tordo), “O rato roeu a rolha” (Tordo), “Açores a cores” ” (Tordo), “O dia do mar” (Tordo), “O meu bairro” (Tordo), “Cinema Paraíso” (Tordo), “Chegam palavras” (Tordo), O homem do jazz” (Tordo) e “Em Timor” (Tordo/João Balula Cid). Leia mais

 

CARTA AO FILHO JOÃO TORDO

O cantor português Fernando Tordo, que está morando no Recife, escreveu carta  ao filho, também famoso, o escritor João Tordo

 

João Tordo

João Tordo

 

CARTA AO FILHO

por Fernando Tordo

Magoaram-te. Não a mim, cinquenta anos de tudo e mais alguma coisa. Magoaram-te porque achas estranho que se diga de um tipo, que para mais conheces bem, o que algumas pessoas disseram e continuarão a dizer.

Perante a tua carta que a Eugénia e teu irmão Francisco Maria me encaminharam, o que é fica? Tentação de devolver os insultos com o vernáculo que bem me conheces e és admirador? Não. O que fica, meu querido filho, é a tua carta.

Tenho tanto que fazer, aqui. Por todos vocês. (Grande fotografia que a tua irmã Joana me mandou) ela e os meus netos, aqueles sorrisos.

Não entristeças, João. Temos dado o melhor de nós e isso não admite gentinha; só aceita dignidade e respeito por vidas que se dedicaram e dedicam não porque têm talento, mas sim porque têm aquele mistério revelado de poderem escrever uma carta como a tua.

Beijo do teu pai fernando.

CARTA AO PAI FERNANDO TORDO

O escritor João Tordo publicou no seu blogue uma carta ao pai, o músico Fernando Tordo, que, aos 65 anos, emigrou para o Brasil. É um testemunho comovente que aqui reproduzimos na íntegra (Jornal Público, Portugal)

Fernando Tordo

Fernando Tordo

CARTA AO PAI

por João Tordo

Ontem, o meu pai foi-se embora. Não vem e já volta; emigrou para o Recife e deixou este país, onde nasceu e onde viveu durante 65 anos.

A sua reforma seria, por cá, de duzentos e poucos euros, mais uma pequena reforma da Sociedade Portuguesa de Autores que tem servido, durante os últimos anos, para pagar o carro onde se deslocava por Lisboa e para os concertos que foi dando pelo país. Nesses concertos teve salas cheias, meio cheias e, por vezes, quase vazias; fê-lo sempre (era o seu trabalho) com um sorriso nos lábios e boa disposição, ganhando à bilheteira.

Ontem, quando me deitei, senti-me triste. E, ao mesmo tempo, senti-me feliz. Triste, porque o mais normal é que os filhos emigrem e não os pais (mas talvez Portugal tenha sido capaz, nos últimos anos, de conseguir baralhar essa tendência). Feliz, porque admiro-lhe a coragem de começar outra vez num país que quase desconhece (e onde quase o desconhecem), partindo animado pelas coisas novas que irá encontrar.

Ao deitar-me, imaginei-o dentro do avião, sozinho, a sonhar com o futuro; bem-disposto, com um sorriso nos lábios. Eu vou ter muitas saudades dele, mas sou suspeito. Dói-me saber que, ontem, o meu pai se foi embora.

Tudo isto são coisas pessoais que não interessam a ninguém, excepto à família do senhor Tordo. Acontece que o meu pai, quer se goste ou não da música que fez, foi uma figura conhecida desde muito novo e, portanto, a sua partida, que ele se limitou a anunciar no Facebook, onde mantinha contacto regular com os amigos e admiradores, acabou por se tornar mediática. E é essa a razão pela qual escrevo: porque, quase sem o querer, li alguns dos comentários à sua partida.

Muita gente se despediu com palavras de encorajamento. Outros, contudo, mandaram-no para Cuba. Ou para a Coreia do Norte. Ou disseram que já devia ter emigrado há muito. Que só faz falta quem cá está. Chamam-lhe palavrões dos duros. Associam-no à política, de que se dissociou activamente há décadas (enquanto lá esteve contribuiu, à sua modesta maneira, com outros músicos, escritores, cineastas e artistas, para a libertação de um povo). E perguntaram o que iria fazer: limpar WC e cozinhas? Usufruir da reforma dourada? Agarrar um “tacho” proporcionado pelos “amiguinhos”? Houve até um que, com ironia insuspeita, lhe pediu que “deixasse cá a reforma”. Os duzentos e tal euros.

Eu entendo o desamor. Sempre o entendi; é natural, ainda mais natural quando vivemos como vivemos e onde vivemos e com as dificuldades por que passamos. O que eu não entendo é o ódio. O meu pai, que é uma pessoa cheia de defeitos como todos nós – e como todos os autores destes singelos insultos –, fez aquilo que lhe restava fazer.

Quer se queira, quer não, ele faz parte da história da música em Portugal. Sozinho, ou com Ary dos Santos, ou para algumas das vozes mais apreciadas do público de hoje – Carminho, Carlos do Carmo, Mariza, são incontáveis –, fez alguns dos temas que irão perdurar enquanto nos for permitido ouvir música.

Pouco importa quem é o homem; isso fica reservado para a intimidade de quem o conhece. Eu conheço-o: é um tipo simpático e cheio de humor, que está bem com a vida e que, ontem, partiu com uma mala às costas e uma guitarra na mão, aos 65 anos, cansado deste país onde, mais cedo do que tarde, aqueles que o mandam para Cuba, a Coreia do Norte ou limpar WC e cozinhas encontrarão, finalmente, a terra prometida: um lugar onde nada restará senão os reality shows da televisão, as telenovelas e a vergonha.

Os nossos governantes têm-se preparado para anunciar, contentíssimos, que a crise acabou, esquecendo-se de dizer tudo o que acabou com ela. A primeira coisa foi a cultura, que é o património de um país. A segunda foi a felicidade, que está ausente dos rostos de quem anda na rua todos os dias. A terceira foi a esperança. E a quarta foi o meu pai, e outros como ele, que se recusam a ser governados por gente que fez tudo para dar cabo deste país – do país que ele, e milhões de pessoas como ele, cheias de defeitos, quiseram construir: um país melhor para os filhos e para os netos. Fracassaram nesse propósito; enganaram-se ao pensarem que podíamos mudar.

Não queremos mudar. Queremos esta miséria, admitimo-la, deixamos passar. E alguns de nós até aí estão para insultar, do conforto dos seus sofás, quem, por não ter trabalho aqui – e precisar de trabalhar para, aos 65 anos, não se transformar num fantasma ou num pedinte –, pegou nas malas e numa guitarra e se foi embora.

Ontem, ao deitar-me, imaginei-o dentro do avião, sozinho, a sonhar com o futuro; bem-disposto, com um sorriso nos lábios. Eu vou ter muitas saudades dele, mas sou suspeito. Dói-me saber que, ontem, o meu pai se foi embora.

 

Tráfico de mulheres em Goiás: exploração e sofrimento

por Zilmarina Camilo de Oliveira

Ilustração Giacomo Cardelli

Ilustração Giacomo Cardelli

No mundo todo, a violência figura entre as principais causas de morte. O tráfico de pessoas é a terceira atividade criminosa mais lucrativa do mundo e considerada uma das mais violentas.

O tráfico de mulheres deve ser entendido como uma das várias formas da violência contra as mulheres.

O conceito de Tráfico de Mulheres adotado pela Secretária de Políticas para as Mulheres da Presidência da República do Brasil – SPM/PR baseia-se em uma abordagem focada na perspectiva dos direitos humanos das mulheres e no Protocolo de Palermo, em que há três elementos centrais: 1. Movimento de pessoas; 2. Uso de engano ou coerção; e, 3. A finalidade de exploração.

Portando, uma mulher pode consentir em migrar para trabalhar como doméstica ou prostituta ou para trabalhar irregularmente em outro lugar, mas isso não significa que ela tenha consentido em trabalhar de forma forçada ou em condições similares à escravidão, bem como em ser explorada, e se isso acontecer fica caracterizado o tráfico de mulheres.

As mulheres em situação de tráfico de pessoas geralmente têm idade entre 18 e 30 anos, são oriundas de classes populares, com baixa escolaridade e estão inseridas em atividades mal remuneradas. Não se pode negar que as mulheres desempenham um papel estratégico nas redes de aliciamento para o tráfico de pessoas, pois o esquema mais utilizado no Brasil é a utilização dos contatos sociais, de vizinhos, amizade e parentes, são considerados fontes confiáveis.

Uma vez aliciadas e submetidas a um regime de exploração em outro país, as mulheres em situação de tráfico de pessoas encontram dificuldades para se desvencilhar da rede criminosa, pois estão em situação de extrema exploração.

O tráfico de mulheres no Brasil encontra terreno fértil por ser este um país com facilidades de entrada em vários outros sem a necessidade do visto; por possuir grande diversidade de “portas-de-entrada” (aeroportos, portos e rodovias); por isso o Brasil é um país de trânsito, origem e destino de mulheres traficadas.

Em Goiás, as vítimas do tráfico, em geral, não tiveram antecedentes de atuação na prostituição e foram para o exterior motivadas por falsas promessas de empregos, como modelos ou dançarinas, e melhor qualidade de vida.

O Código Penal Brasileiro, com as mudanças trazidas pela Lei no. 11.106, de 28 de março de 2005, e pela Lei no. 12.015, de 7 de agosto de 2009, criminaliza o tráfico internacional (artigo 231) e interno (artigo 231 – A) de pessoas (homens e mulheres) para fins de prostituição ou outra forma de exploração sexual.

Entrevista com a Psicóloga Beth Fernandes

– Quando se iniciou o tráfico de mulheres em Goiás?

– A partir de 1998. A Astral atende mulheres vítimas do tráfico desde 2002.

– Quando as mulheres recebem o convite para irem trabalhar no exterior, elas sabem que irão se prostituir?

– Acredito que 80% sabem que vão para outro país para se prostituírem, mas elas não sabem as condições de trabalho a que vão ser submetidas.

– De qual localidade do Estado de Goiás saem em maior quantidade mulheres que vão para o tráfico?

– Do município de Uruaçu.

– Goiás está em qual colocação no Tráfico de Mulheres?

– Em 4º. Lugar.

– Quais são os principais destinos dessas mulheres e por quê?

– Elas vão principalmente para Portugal, Espanha e Suíça. Para a periferia da Espanha, elas vão em maior quantidade, para atender os trabalhadores das plantações de fumo. Láf, ficam até quatro meses sem tomar banho, e às vezes não pagam.

– Em geral quanto elas recebem?

– São pagas em dólares, 35 dólares, a casa fica com 15 dólares e a mulher com 20.

– Existe ameaça às famílias dessas mulheres, aqui no Brasil?

– Sim, sem dúvida, temos relatos de muitos casos. Tem um caso em Anápolis, que a casa de uma delas foi incendiada.

– Qual o estereótipo de mulher brasileira preferido pelos traficantes?

– As afro-brasileiras.

– Qual organismo responsável pelas investigações do tráfico de mulheres?

– A Polícia Federal.

– Quais são as ações concretas para coibir esse tráfico?

– Existem três eixos: o eixo de repressão, o eixo de prevenção e o eixo de acolhimento.

A psicóloga Beth Fernandes ressalta a importância da reformulação dos cursos universitários do Brasil, pois, é necessário questionar as grades curriculares, por não incluirem disciplinas sobre violência, gênero e sexualidade, a fim de que essas novas disciplinas venham trazer à discussão uma abordagem sobre as várias formas de violência e as desigualdades entre os gêneros. Ela diz ainda, que a discriminação ao trabalho sexual tem proporcionado inúmeros sofrimentos e danos ao grupo de mulheres mais pobres, assim, mais vulneráveis, pois, muitas delas são levadas à prostituição como única forma de renda e emprego.

EL DOCTOR MARIHUANA

in THE RBP INTERVIEW

Más que un fumador es un sanador. Milton Flores es un siquiatra que ha dedicado su vida a la terapia con plantas mágicas. Sin embargo, la sociedad le ha devuelto la mano con 41 días de presidio remitido por tener una considerable plantación de cannabis en su parcela de Paine. Él decidió hacer público este escándalo para destrabar el debate del autocultivo. En esta entrevista, enrolamos algunas de sus ideas.

Por Loreto Contreras y Juan José Toro / Fotos: Andrés Santa María

Flores

Desde su parcela en Águila Sur, a cuarenta y cinco minutos del centro de la capital, está Milton Flores. El siquiatra de 57 años, se expresa tranquilo mientras muestra la sala del Instituto Triagrama, centro de sanación de doce años de trayectoria. Tiempo que pareciera poco para Milton, quien ha dedicado casi toda su vida al área de salud comunitaria.

Durante estos años ha trabajado en profundizar las técnicas de medicina alternativa, buscando una apertura en los sentidos para aumentar la percepción. En ese viaje descubrió las posibilidades de sanación que otorgan los enteógenos como la marihuana, ayahuasca y san pedro, entre otros psico activos que utiliza en las terapias.

¿Cómo ha sido la asimilación política y social del consumo de cannabis?

Hay mucha gente consumiendo y que no tiene ninguna conducción. Para poder tener cannabis tiene que pasar por el narcotráfico y correr el riesgo que esto implica, ya sea que le pongan otra cuestión, que le den cualquier cosa o ser sancionado por la ley. Vivimos en un sistema paradójico donde es evidente que hay delincuencia asociada al narcotráfico. Sin embargo, existe una represión sistemática a las personas que hacen uso consciente del consumo de marihuana. Hay familias completas que son perseguidas sólo porque tienen integrado en su cultura el consumo. Otros fuman e inevitablemente piensan que están haciendo algo malo, se sienten culpables. No hay educación al respecto, se nos enseña que la planta intrínsecamente es mala, cuando esto es una valoración.

¿Cuáles serían los efectos de legalizarla?

Por un lado, la fiscalía, la policía, la defensoría, los tribunales y las cárceles dejarían de gastar plata de forma innecesaria. Después, evidentemente como se ha visto en Portugal, la despenalización traería la neutralización de la delincuencia. La legalización tiene un impacto fuerte en el narcotráfico. Nosotros sabemos que cuando hay cannabis en las calles, el narcotráfico pierde clientes, porque la gente prefiere fumar lo que ellos han cultivado. Pero lo más importante es que la despenalización permitiría abordar temas de seguridad pública, de salud pública y de ajustes financieros. El fiscal se queja que no tiene plata, pero su política lo tiene persiguiendo cosas que no hay para qué perseguir. Si él hiciera una interpretación más lúcida la ley, se daría cuenta que necesariamente tiene que distinguir cuando es narcotráfico o no, al igual como lo debiese hacer Carabineros. Tienen que saber que esta prohibición ampara, y, en cierto modo, justifica el narcotráfico.

¿Podemos decir que esta batalla por la legalización o el autocultivo, podría ser el comienzo de una etapa de despertar de conciencia de las personas?

En salud mental estamos usando la cannabis y el espacio legislativo para instalar otro paradigma. En salud mental lo que se requiere es recuperar la espiritualidad en una dinámica colectiva habitual, ese es el objetivo, anhelo, cambio, transformación y evolución. Queremos, a través de esta jugada con el Poder Judicial, poner en jaque la Justicia, porque los ciudadanos que estamos siendo imputados tenemos derechos y los estamos ejerciendo. Al fiscal le mandamos toda la trayectoria, en las cuales le mostramos aplicaciones de nuestra perspectiva sin cannabis, para cultivar la percepción en el SENAME, en INDAP, en el Ministerio de Salud. Trabajos que han sido muy bien evaluados, con un certificado de conformidad de la institución. Trabajamos el semestre pasado en el Senado, todos los meses hablando de espiritualizar la política, de que en educación tienen que haber proyectos que incluyan el desarrollo de lo espiritual, que haya personal responsable con espiritualidad incluida para poder atender la vida espiritual de los niños. Si no se hace eso seguimos donde mismo. Y el fiscal sabe todo esto. Pero cuestionó lo que le presentamos un físico, un salubrista, un psiquiatra, un académico y psicólogo de 30 años, un magíster en salud pública. Dijo que no era suficiente para decir que este era un trabajo de investigación científica.

Respecto a lo acontecido tras su detención y el protagonismo mediático, ¿sientes que hay una persecución hacia ti, mediante la cual se busca deslegitimizar la marihuana?

De repente al fiscal se la ha pasado la mano, pero él actúa dentro de su lógica y me doy cuenta que no es nada personal. Sin embargo, el tipo ha comprometido mi derecho, la protección que él también tiene hacía mí. Él está para hacer Justicia, para investigar de manera ingenua para así poder encontrarse con la verdad, no para corroborar la tesis que a él se le ha instalado en la cabeza en primera instancia. No obstante la caricatura de doctor marihuana que me han puesto, los medios de difusión han sido particularmente respetuosos. Muchos periodistas reconocen que los espacios no están tan disponibles y que ellos han hecho un esfuerzo por tratar de afirmar y cubrir esta información, con la altura de miras que se merece. Perciben que aquí hay una jugada mucho más trascendente que está más allá de la cannabis, que hay un tema más de expansión, trabajo y salud mental. En este minuto el cuarto poder, que son los medios de comunicación, y el quinto poder, que es la comunidad, se han juntado y han puesto en jaque la valoración legal de cannabis, ejemplo de esto es cuando en el reportaje de Televisión Nacional muestran al juez titubeando al dar la sentencia.

¿Cómo y dónde la conociste la marihuana? ¿Qué usos le dabas inicialmente cuando eras estudiante?

Yo vivía en Arica entre 1969 y 1971. Mi papá fue suboficial de la Armada por lo que nos trasladamos desde Talcahuano hacia el norte. En esos años pertenecía a un grupo juvenil católico y tenía una conexión espiritual desarrollada. A los 15 años tuve mi primera experiencia con la Santa María, junto a un grupo de amigos de manera lúdica y exploratoria, aumentó mi sensibilidad de las sutilezas en la convivencia. Luego me trasladé a Concepción a estudiar Medicina, y ahí me gustaba fumar en patota y caminar. Durante ese tiempo no cultivaba, ya que era muy fácil adquirirla.

¿Como médico en qué momento integraste el uso terapéutico de la cannabis?

Trabaje en Psiquiatría en el Hospital Barros Luco, y ahí se ofrecía una aproximación sistémica, psiquiatría clásica vinculada a la teoría de la comunicación y sistemas donde se empieza a relativizar lo absoluto de la observación. Según (Humberto) Maturana el observador en este proceso es trascendente. Luego en el Peral, relativizando los diagnósticos, viendo que la psiquiatría clásica usaba paradigmas materialistas donde el observador es Dios, uno va trabajando enfermedades, como la esquizofrenia consciente de la subjetividad del observador, interviniendo los sistemas. El estado normal es no estar. Las personas sufrimos por estar siendo esclavos de una definición acerca de las cosas con la que cargamos, y que juramos es la realidad misma. La depresión es la expresión de sensibilidad de un sujeto, no sabe cómo conducirse en esas aguas que son naturales y metabolizar esa emoción, al estar formados para exhibir un grado de conciencia limitado. En 1987, trabajé a cargo del COSAM (Centro Comunitario de Salud Mental Familiar) de la Reina, y ahí comenzamos los tratamientos con sustancias psicoactivas en pacientes con adicciones, todas las experiencias previas me confirmaron que había que intentar algo diferente, y es así como integramos estas sustancias realizando un esfuerzo por despertar al humano, de otra forma y permitirle observarse desde otro plano. También le entregamos terrenos a los alcohólicos para que cultivasen hortalizas.

Flores 2

¿En qué momento le dejan de llamar marihuana y le empiezan a llamar Santa María?

Cuando nosotros nos dimos cuenta que los enteógenos te permitían una oportunidad para perfeccionar tu contacto con la realidad, en vez de cabecear moléculas y escuhar Pink Floyd no más. Puedo escuchar, pero igual estar más presente, más consciente. Cuando yo estoy consciente, Pink Floyd es un elemento dentro de otros muchos y la gracia que se obtiene es superior porque yo aprendo a priorizar, aprendo a qué hacer conmigo cuando fumo, a ser algo mejor de lo que soy habitualmente, no me dejo llevar por la ola, sino que me monto arriba y empiezo a manejar.

A un consumidor habitual, ¿cómo se le podría formar o enseñar a darle este uso distinto del pito a la Santa María?

Distintas formas. Cuando una persona fuma, más allá del entendimiento que alcancen, lo que ocurre es que van acumulando impresiones expandidas, momentos donde un contacto, una impresión de realidad, es más plena. Uno va acumulando eso, no se pierde. Hablarle a los que fuman cannabis, es hablarle a un público que está mucho más sensible a comprender a lo que estamos hablando, mucho más sensible que los que no han fumado nunca. Ahora, hay grados y grados de comprensión sobre la materia. Hay algunos que la mezclan, que la usan para comer asado, chocolate, toman copete, todo junto. A veces ni siquiera saben de lo que le estás hablando. Pero el que ha tenido la oportunidad de fumar tranquilo en la playa solo, saben de lo que se está hablando. Acá tenemos prácticas regularmente, donde las personas vienen y nosotros conducimos el trabajo. Distintos ejercicios le pueden permitir a la persona recuperar un grado de objetividad en su observación superior a la habitual. Una persona puede sentir la planta de sus pies mediante instrucciones, sentir más su propio cuerpo cuando está teniendo sexo, o baila y siente cómo se mueve el cuerpo. Te ofrece una perspectiva trascendente. Algo fundamental es que haya disposición realmente a aprender.

¿Y a la gente que le pasa lo contrario, que siente que fumando marihuana se atrapa aún más y sienten angustia, y dejan de fumarla porque tienen esta experiencia y después se bloquean?

Hay que saber comprender el fenómeno. Con cannabis o con otro enteógeno, promueves una apertura violenta y sin previo aviso. Sin la confianza, sin las condiciones suficientes para que el otro se entregue a esta apertura, la persona neurótica se perturba mucho, se le desintegra la estructura de personalidad a la cual se encuentra fuertemente arraigada y dependiente.