NO PALCO ETERNO DO MUNDO DISTANTE DO BERÇO PRIMEIRO
por Walter Santos
Sobre Ariano Suassuna nada mais precisa ser dito. O Planeta intelectual brasileiro já o fez ao assimilar o Mestre das palavras e dos enredos, por isso pouco acrescentará de agora em diante. Mas há um vazio histórico registrando 87 anos de angústia e de desprezo dele para com seu passado quando se trata de relacionar-se com a referência de João Pessoa (o personagem, sobretudo) respingando na sua relação com a aldeia Paraiba levando-o aos braços de Pernambuco, onde quis guardar seus restos. Mesmo que não queira, agora é tarde, a História o faz personagem de vida iniciada na então Parahyba nascendo no Palácio da Redenção, na Capital Paraibana, só que isso de nada mais adiantou enquanto apelo afetivo. Será o Nego da bandeira, a cultura de caranguejo ou nossa má sorte de ter nossos Heróis cultuados nos braços dos outros, mesmo fortes como Pernambuco? De qualquer forma, nada supera a dor e o amor que seus conterrâneos devotaram e hão de devotar para sempre.
REFLEXÕES SOBRE JOÃO GRILO
por Celso Marconi Lins
Ariano deitado num leito de hospital, sofrendo com as dores de um AVC, é um momento fundamental para a reflexão, pois há dois dias atrás ele estava palestrando no Teatro Souto Dourado, em Garanhuns, falando sobre o seu amigo compositor Capiba e, inclusive, falando que o seu personagem João Grilo não é nenhum anti-herói, mas sim um herói, pois ele vence todos os componentes do espectro social como o padre e o bispo, a religião e o fazendeiro, e o dono da padaria e da farmácia, e todos os demais integrantes da burguesia. Então, por que ele não seria um herói?
Só que Macunaíma também vence todos os participantes que lhe passam à frente, inclusive vence o preconceito brabo racial, passando de preto para um legítimo representante dos brancos, e no filme de Joaquim Pedro de Andrade, Macunaíma é primeiro representado por Grande Otelo, preto, e depois pelo branco Paulo José, inclusive com os cabelos louros, mas nem por isso deixa de ser um anti-herói porque anti-herói é o herói que vence, mas não pelos termos oficiais. Vence sub-repticiamente. Vence pela valentia que aparenta uma covardia, e não pelas posições que o oficialismo tem como vitoriosas. João Grilo vence pela astúcia, pela força do mais fraco, mas muito mais sabido e mais inteligente.
O personagem criado por Ariano, através da figura popular de João Grilo e, também, de Xicó, vem do folheto de cordel numa brilhante adaptação e numa verdadeira apropriação da cultura popular riquíssima.
Talvez as suas origens burguesas façam com que Ariano não veja que seu teatro chegou até mesmo onde talvez sua ideologia não poderia ter seguido, mesmo que, externamente, seu desejo seja ir muito além no caminho do popular e não se fechar.
Bairro novo Olinda, 22 julho 2014